sexta-feira, 5 de junho de 2009

Engenheiros do tempo desconhecido



Um conjunto de filmes em 35 milímetros, com propostas para uma ciência alternativa e revolucionária, dão corpo à exposição que João Maria Gusmão e Pedro Paiva levam à Bienal de Veneza, este ano dedicada ao tema Fazer Mundos. Trata-se da representação oficial portuguesa, patente ao público no Pavilhão da Fundação dell'Arte, entre os dias 7 de Junho e 22 de Novembro, com inauguração marcada para hoje, sexta-feira, 5.
Esta presença de João Maria Gusmão e Pedro Paiva numa das maiores iniciativas do circuito das artes plásticas é o coroar de uma crescente visibilidade internacional, confirmada pelas inúmeras mostras que apresentaram, nos últimos dois anos, em vários pontos do mundo. Experiências e Observações em Diferentes Tipos de Ar surge na sequência do projecto Abissologia, exibido na Cordoaria Nacional e na Mina Campina de Cima, em Loulé. Mantendo os mesmos pressupostos teóricos e artísticos, esta exposição convoca três dimensões, segundo o comissário Natxo Checa: «O estudo de fenómenos singulares numa tentativa de compreensão do mundo; a afeição a uma metodologia científica; e o entendimento da poesia como possibilidade de aferição de um mundo apenas parcialmente discernível». É a habitual apetência da dupla para a criação de um novo conhecimento, fundado na tradição científica e literária.
Neste caso, os artistas, nascidos em Lisboa, em 1979 e 1977, respectivamente, recuperam o dilema entre a tese de Antoine Lavoisier e a de Joseph Priestley acerca da natureza do oxigénio. De resto, o título da mostra recupera o tratado homónimo de Priestley, associando-o a uma leitura poética na busca da essência da «transmutação». «Estamos perante a construção de uma série de guiões ficcionais, de perfil literário, enraizados na observação de fenómenos particulares e no desenho de uma arquitectura filosófica própria», afirma Naxto Checa. «As propostas de João Maria Gusmão e Pedro Paiva, assentes num certo tipo de pesquisa empírica ou na especulação delirante, surgem a partir de um método racionalista que procura dar conta da excepção dos fenómenos. Mediante a sobreposição de estratos (fruto da penetração entre o literal e o metafórico), elaboram-se, ao longo da sua obra, relatos que não podem ser assumidos por um código instituído, lembrando, muitas vezes, uma compilação de factos documentados sem aparente explicação.»
É sobre este substrato teórico, criado por estes engenheiros do tempo desconhecido (aquele que a história e os vencedores não confirmaram), que assentam as obras de João Maria Gusmão e Pedro Paiva. Filmes na sua maioria, mas também instalações e fotografias, que evocam o processo que os artistas desenvolveram na criação desta ciência alternativa, que deve mais ao humor e à ironia do que ao rigor. Pois são efabulações artísticas e estéticas, em torno do invisível, do instável e do efémero. A perene matéria-prima da arte.

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