quinta-feira, 7 de maio de 2009

Vêm aí os piratas!


Os piratas estão de volta. Não os hackers que se infiltram nos sistemas informáticos mais sofisticados, mas os verdadeiros: os que se ocultam nos recortes da costa para surpreender indefesos navios mercantes. Dos mares da China ou da costa da Somália, chegam, semana após semana, novos relatos de ataques ou de fragatas da marinha postas de atalaia. Devíamos sentir repúdio e, no entanto, o sentimento que nos toma é um fascínio quase infantil. A culpa, está de ver, é do cinema. Ao contrário do que acontece nos westerns, Hollywood (e realizadores como Raoul Walsh ou Michael Curtiz) atribuiu aos piratas uma qualidade de contra-poder, mostrando-os como o ladrão que roubava a ladrão e que se, não obtinha cem anos de perdão, conquistava, pelo menos, a simpatia (e por vezes a identificação) dos espectadores. Esta opção tornou-se muito evidente em filmes como The Spanish Main ou em Captain Blood. No primeiro caso, Van Horn ter-se-á tornado o «terror das Caraíbas» após prolongada sujeição à tortura infligida pelo governador espanhol de Cartagena de las Indias. No segundo, Peter Blood, um médico inglês condenado à escravatura por um crime que não cometeu, torna-se, por desespero, um pirata que trata com humanidade e alguma democracia a turba que comanda.
A propósito deste tema que, confesso, me é caro, recomendo a leitura de Os Piratas - Piratas, Flibusteiros, Bucaneiros e outros Párias do Mar (edição Antígona). Da autoria do ensaísta francês, Gilles Lapouge, é um texto cativante sobre a pirataria, quer do ponto de vista historiográfico, quer ensaístico. Para além de evocar as muitas aventuras de temíveis criaturas como o Capitão Morgan ou Anne Bonnie, esta obra reflecte de forma muito bela sobre este fenómeno: «O pirata é um homem descontente. O espaço que lhe consentem a sociedade ou os deuses parece-lhe exíguo, nauseabundo, desconfortável. Sujeita-se por uns breves anos e depois diz "estou farto" e recusa-se ao jogo». Estranhamente actual? Quantos pacatos cidadãos, de horizontes estreitados pela ganância alheia, são hoje candidatos a este exército de sombras?

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