sexta-feira, 3 de julho de 2009

Um Deus falhado

As metamorfoses dos media são por demais evidentes e o caso da morte de Michael Jackson só veio demonstrar os excessos do fenómeno. A notícia da morte do cantor foi adiantada, em primeiríssima mão, pelo TMZ, site maldito que coscuvilha a vida privada de personalidades (e, pelos vistos, também a morte). Ultrapassou largamente a televisão. A Sky News avançou com a notícia da notícia: «A TMZ noticiou que Michael Jackson morreu). A CNN recusou-se a seguir o portal, simplesmente ignorando-o. Esperou pela fonte seguinte, o on-line do credível jornal LA Times. E então, novamente noticiou a notícia, dizendo: «O LA Times anunciou que…» Colocando sempre a ressalva: «A CNN ainda não confirmou». E com este cuidado extremo da maior cadeia noticiosa do mundo (que também se verificou, por exemplo, nas eleições americanas), passadas duas horas ainda não tinha sido confirmada coisa nenhuma. Ao ponto de nos perguntarmos: «Será que estes tipos já confirmaram a notícia da morte do Elvis?».
O caso serve de paradigma. No que diz respeito a notícias de última hora, os meios on-line ultrapassam facilmente todos os outros, mesmo a televisão. Contudo, um canal como a CNN, tem que defender, a todo o custo, a sua credibilidade. Se a notícia é avançada pela CNN, sabemos que é verdade. Se é dada por um qualquer site é legítimo desconfiarmos.
Michael Jackson é, por si só, um paradigma tecnológico. Enquanto inúmeros cientistas desenvolveram a robótica de forma a criar máquinas que se pareçam com homens, Jackson dedicou grande parte da sua vida a querer parecer-se com uma máquina. Começando, de forma criativa, com alguns dos seus passos de dança, nomeadamente o famoso Moonwalking, em que desliza de forma tão perfeita que nos faz crer que não é humano.
Depois há toda uma questão tecnológica ligada à sua imagem. As mutações (ou mutilações) que provocou ao seu corpo, em busca do mais estranho conceito de beleza, contribuíram, com certeza, para significativos desenvolvimentos a nível da cirurgia plástica, entre outras ciências médicas.
Além disso, Michael Jackson quis convencer-nos de que era imortal. Já que era rei do pop ousou ser Deus. Numa divinização da sua imagem, chegou a limites extremos de isolamento, com medo de contágios. «Gosto muito de vocês, mas por favor não me toquem». Transformou-se numa espécie de alienígena, demasiado branco para ser real. E ficou por cumprir o sonho humano de que falava Raul Brandão: viver para sempre. Foi mais um Deus que falhou no momento decisivo.

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