Borges haveria de gostar de Marrocos. Não sei se o escritor argentino, entre as suas andanças, passou por aqui, mas a verdade é que tem tudo o que o seduziu em vida. A vocação para as aparências, os jogos de espelhos, a tentação pelo desconhecido, a volúpia do abismo. Em Marrocos, nada é o que parece ser. Porém, não se trata propriamente das famosas matrioskas russas, que escondem segredos atrás de segredos, mesmo que no fim apenas reste uma sombra do início.
Aqui, na Medina de Fez, tudo é diferente, tudo nos conduz a um novo início, todas as ruas se abrem para novas ruas. Não há princípio, nem fim. Até os becos sem saída dão para sumptuosos riades de reservados confortos. No comércio, há um preço inicial, que depois se transforma noutro valor, ainda com espaço para descontos. Nos restaurantes, há um menu principal que rapidamente dá lugar a um menu especial, e ainda se pode pedir prato a prato.
Também as pessoas não são uma só. Como algumas personagens de Borges, ou dos romances que ele gostava de ler, têm múltiplas identidades. Têm o que precisamos, na altura e nos lugares certos. Se procuramos um guia para o labirinto de Fez, ele aparece na primeira esquina; se é só uma indicação, ela chega-nos com um sorriso; se o desejo é uma viagem mais longa, talvez até ao deserto, há um carro pronto para partir. Não se pense, contudo, que nesta duplicidade se afirma um rol de mentiras, muito bem apontado à desatenção do turista. Pelo contrário, é a afirmação da verdade de um povo. Disponível para receber, cordial em qualquer ocasião – menos na delinquência, como em todos os países – e preparado para conquistar um novo cliente, como para se render à evidência do seu desinteresse. Numa linguagem provavelmente paradoxal nesta sociedade, é o processo que mais conta, ou a dinâmica, ou a dialéctica, como diria Marx. Num mundo com raízes tão profundas na Idade Média, é a ideia de work-in-progress que mais faz sentido. Nas ruas que não páram de crescer, mais para cima do que para os lados, nas relações humanas que se estabelecem e nas surpresas do quotidiano. Aqui, em Marrocos, na Medina de Fez, a porta para o outro lado do espelho está sempre aberta. Como Borges tão bem sabia.
Aqui, na Medina de Fez, tudo é diferente, tudo nos conduz a um novo início, todas as ruas se abrem para novas ruas. Não há princípio, nem fim. Até os becos sem saída dão para sumptuosos riades de reservados confortos. No comércio, há um preço inicial, que depois se transforma noutro valor, ainda com espaço para descontos. Nos restaurantes, há um menu principal que rapidamente dá lugar a um menu especial, e ainda se pode pedir prato a prato.
Também as pessoas não são uma só. Como algumas personagens de Borges, ou dos romances que ele gostava de ler, têm múltiplas identidades. Têm o que precisamos, na altura e nos lugares certos. Se procuramos um guia para o labirinto de Fez, ele aparece na primeira esquina; se é só uma indicação, ela chega-nos com um sorriso; se o desejo é uma viagem mais longa, talvez até ao deserto, há um carro pronto para partir. Não se pense, contudo, que nesta duplicidade se afirma um rol de mentiras, muito bem apontado à desatenção do turista. Pelo contrário, é a afirmação da verdade de um povo. Disponível para receber, cordial em qualquer ocasião – menos na delinquência, como em todos os países – e preparado para conquistar um novo cliente, como para se render à evidência do seu desinteresse. Numa linguagem provavelmente paradoxal nesta sociedade, é o processo que mais conta, ou a dinâmica, ou a dialéctica, como diria Marx. Num mundo com raízes tão profundas na Idade Média, é a ideia de work-in-progress que mais faz sentido. Nas ruas que não páram de crescer, mais para cima do que para os lados, nas relações humanas que se estabelecem e nas surpresas do quotidiano. Aqui, em Marrocos, na Medina de Fez, a porta para o outro lado do espelho está sempre aberta. Como Borges tão bem sabia.
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